quinta-feira, abril 14, 2005

problema não se importa

Hoje prenderam um jogador argentino em São Paulo. O cara teria xingado o Grafite, do SPFC, chamou de macaco, sei lá...

Foi indiciado, passou a noite na cadeia. Tudo muito justo. Como sempre, deve pagar uma fiança e sair tranqüilo.

Mas tem coisa escrota. Por que só com negros?

Se é um crime fazer um comentário pejorativo, e discriminar alguém, por que ninguém nunca puniu alguém que agride outra pessoa chamando de viado, de paraíba, índio ou de filho-da-puta???

Eu fico imaginando. O caro leitor já pensou sobre isso? O jogador sai de campo reclamando:

- Ele desrespeitou minha querida mãe.... Só porque ela era “da vida”....

Ou então:

- Eu ser gay não é motivo pro zagueiro me xingar dentro da área....

Será que os jogadores que reclamassem disso seriam levados à sério??? Ou será que até o narrador e os comentaristas do século XIV não perderiam a chance de ser “bem-humorados” e fazer uma piadinha???

Vou mais longe ainda. Será que alguém prenderia um jogador chamado de “branco-azedo”? Será que essa expressão seria considerada racista?

Não estou aqui defendendo o argentino. A punição, como já disse, é justa. Até porque outro jogador já tinha feito a mesma coisa, lá no jogo no campo do Quilmes.

Mas a impressão que sempre tenho é que o brasileiro, naquela eterna vontade de ser “gente”, de participar de problemas internacionais, acaba importando questões que não tem absolutamente nada a ver. Como essa do racismo.

Todo mundo sabe que o problema do racismo na Europa vai muito mais além. Não é questão de branquinho ou pretinho apenas. Existe preconceito com judeu, com polonês, com árabe, com francês, com asiático e com tudo que você imaginar, desde que não seja parecido com o povo da cidade ou país em questão.

Mas aí o que acontece?? Algo estranhíssimo. Os negros brasileiros, talvez na ânsia de participar dessa luta mundial por seus direitos, utilizam aquela escrotérrima mania dos brancos brasileiros: a de importar o que se faz na Europa. Mesmo que seja essa história ridícula do preconceito.

Legal. Daí o que acontece? Ninguém resolve os problemas que temos aqui. Fingimos que nossa questão é entre brancos e negros, e assim esquecemos da pobreza, da violência, da falta de infra-estrutura e de outros problemas “menos nobres” que o racismo. Afinal, é muito mais bacana, muito mais hypado discutir isso. Quem precisa que se discuta os favelados, mesmo que sejam brancos? Quem precisa que se discuta a miséria que vai do Sul ao Nordeste? Quem liga pra miséria de pardos?? Quem precisa que se discuta o massacre dos índios? Que coisa de pobre discutir isso.... Em Paris ninguém fala sobre esse assunto. Em Londres não tem favela. Em Bruxelas não tem nordestino.

De qualquer forma, o cara já foi preso, e até eu estou usando meu blog estranho pra falar sobre isso. Não sei porque. Talvez eu também ache importante entrar num debate tão “europeu”. Mas, ainda me ocorre uma dúvida, já que todas as pessoas que conheci, com apelido de “Grafite”, o tinham por causa da cor da pele. Será que o Grafite não achou um absurdo quando colocaram esse apelido nele?? Porque ele joga com esse nome, e não com o seu (Edinaldo Batista)? Para mim sempre pareceu um apelido preconceituoso, coisa de conde-escravista, coisa de latifundiário de cana-de-acúcar. Mas fazer o quê? Cada um escolhe os problemas que quer ter.

Talvez o conspícuo leitor não entenda meu ponto-de-vista, mas o que quero que perceba é que essa grande demagogia de Globo Esporte, essa coisa de “alma não tem cor”, só vai me parecer sincera no dia em que alma também não tiver sexo, naturalidade ou classe social também. No dia em que o jogador do time pequeno não tiver vergonha de dizer que o do time grande o chamou de roceiro, no dia em que o jogador suburbano reclamar de outro o chamar de favelado e do jogador gay se assumir, e reclamar até da torcida. Será que nessa hora vão prender todos que gritarem “Viadinho!!!”???

Brunolo é também é descendente de africanos de Cabo Verde, portanto, não venham com historinhas de que ele é racista...